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sábado, 27 de dezembro de 2008

Blindness


Depois de vários anos a recusar-se vender os direitos do livro "Ensaio Sobre a Cegueira" - José Saramago rende-se finalmente aos encantos do aclamado realizador brasileiro - Fernando Meireles (" Cidade de Deus", "Fiel e Jardineiro").

Desde logo, tornou-se evidente que adaptar o prémio Nobel português da literatura, ao cinema, não iria ser tarefa fácil - tanto pela complexidade das suas personagens como também pela sua relação com o espaço, enquanto invisuais. Para isso destaca-se a fotografia de César Charlone que cumpre convenientemente a sua missão, exprimindo um grande cuidado em invocar a cegueira a partir da luz e dos planos, onde prevalecem as imagens queimadas, esbatidas e até desfocadas, as cores frias e muitas vezes uma abstracção dos elementos. Numa ou noutra cena as personagens parecem flutuar num "mar de leite" tal e qual como é descrito no livro.


O melhor: a interpretação de Julianne Moore e a fotografia de César Charlone (" Cidade de Deus" e "Fiel e Jardineiro").

O primeiro ser humano é atingido por uma misteriosa cegueira branca - vírus que rapidamente se propaga atingido muitos outros habitantes da cidade. Para lhe fazer frente, e visto o total desconhecimento, o Governo coloca os infectados de quarentena num velho hospital psiquiátrico. E o tempo passa... a chegada de cada vez mais doentes e a falta de alimento faz com que alguns dos demais infectados comecem a tirar o seu próprio partido. Largados ao abandono os sobreviventes terão de lutar.

Blindness
retrata personagens sem nome, num lugar desconhecido, num tempo indefinido. Retrata aqueles que perderam subitamente a visão, e uma mulher (Julianne Moore) que carrega consigo o fardo de ser a única que permanece ilesa à cegueira. Não se pode dizer que Moore seja a protagonista, porém à que admitir que nela recai toda a fonte de riqueza dramática da trama - além de ser nitidamente a personalidade mais explorada. Pena é, que outros não tenham tido o mesmo grau de atenção, como no caso de Danny Glover que se assume a certa altura como narrador, mas que pouco nos diz como personagem interveniente na história. Além disso Blindness peca também pela banda sonora que nada acrescenta as imagens - que transmite muito pouca emoção.
Globalmente as mulheres destaca-se, arrebatando-nos com momentos de plena beleza e serenidade, incorporando a força e a coragem num cenário atroz. Elas têm o dom de conseguir mudar o rumo da história.

A Cegueira é a metáfora utilizada para caracterizar o mundo onde vivemos, concretizando o fenómeno do homem de se encontrar permanentemente cego. Posso concluir que Blindness não consegue ser tão bom como "Cidade de Deus" ou "Fiel e Jardineiro", mas sem dúvida que este não lhe ficará indiferente.

2 comentários:

via disse...

gostei muito, embora não tenha lido o livro e ainda bem porque a experiência: primeiro livro depois filme é , na maior parte das vezes, negativa. Gostei dos três há, sem dúvida, uma proximidade, um enternecimento pelas personagens no cinema do meireles.

Leonel Meneses disse...

sublinho quando dizes que a fotografia e julianne moore sao o "melhor" do filme. É um filme forte, a certa altura apetecia-me fechar os olhos e não o ver. Noutras sentia que mante-los abertos é das melhores coisas da vida.